Memoria e trauma em “O céu dos suicidas” de Ricardo Lísias.

Wilson Cavalcante Costa Junior*

Ricardo Lísias, foto de Twitter

Resumo

O presente estudo propõe uma investigação da representação da memória e trauma em O céu dos suicidas (2012) de Ricardo Lísias. Nessa perspectiva empreende-se a hipótese de que pessoas que compartilham amizade ou sentimentos com pessoas próximas, como amigos e parentes, e não conseguem evitar que se suicidem ou que sejam presas ou torturadas, desenvolvem um profundo sentimento de culpa e caem na depressão, isso partindo da perspectiva da memória e do trauma. Assim, o problema desta pesquisa é: Porque o personagem principal O Céu dos Suicidas desenvolve profundas marcas de melancolia que só são superadas através da exorcização de sua dor, como é o caso do personagem principal da referida obra literária de autoria de Ricardo Lísias? o objetivo geral deste estudo é investigar, no romance O céu dos suicidas (2012) de que forma se dá a representação da memória trauma, tendo como objetivos específicos: identificar as implicações autobiográficas e autoficcionais na obra O céu dos suicidas, a partir das declarações expressas pela personagem/narrador/protagonista Ricardo, e mostrar porque ela se encaixa na escrita autoficcional do gênero escrita de si; descrever as marcas da representação da memória e subjetividade que perpassam a obra O céu dos suicidas da autoria de Ricardo Lísias, enfocando os aspectos que a aproxima e distância do trauma e da memória; e como específicos: analisar os tipos de traumas sofridos pelas personagens principais em O Céu dos Suicidas que foram causa das mudanças sofridas pelo protagonista/narrador/autor Ricardo que o levaram à melancolia e depressão nesta obra.

Nesse sentido, situamos a obra no âmbito dos estudos do gênero autobiográfico conforme os critérios apresentados por Philippe Lejeune (2008) e os estudos sobre o pacto autobiográfico e autoficcional ou pacto ambíguo, levando em consideração os pressupostos teóricos de Manuel Alberca (2007) e Philippe Willemart (2009), que enfocam os processos de criação, e Ângela Gomes (2004), que trata da escrita de si e da auto ficção, além da escrita da História, que sinaliza para uma relação de violência e poder, entre outros que auxiliarão no processo de investigação. No debate sobre auto ficção, nos apoiaremos nas contribuições de Alberca (2007), Arfuch (2010) e Costa (2020). Sobre a questão da memória, componente indispensável para os estudos da escrita de si, lançaremos mão dos estudos desenvolvidos por Izquierdo (2013) e Halbwachs (1990), só para citar alguns que nos darão o suporte necessário para desenvolver o debate sobre memória, aspecto indispensável para quem estuda o gênero da escrita de si.

Palavras-chaves  

Memória; trauma; O céu dos suicidas; Ricardo Lísias

Abstract

The present study proposes an investigation of the representation of memory and trauma in ‘O Céu dos Suicidas’ (2012) by Ricardo Lísias. From this perspective, the hypothesis is undertaken that people who share friendship or feelings with close people, such as friends and relatives, and cannot avoid committing suicide or being arrested or tortured, develop a deep sense of guilt and fall into depression, this from the perspective of memory and trauma. Thus, the problem of this research is: why does the main character ‘O Céu dos Suicidas’ develop deep marks of melancholy that are only overcome through the exorcism of his pain, as is the case of the main character of the aforementioned literary work by Ricardo Lísias? The general objective of this study is to investigate, in the novel ‘O Céu dos Suicidas (2012)’, how the trauma memory is represented, having as specific objectives: to identify the autobiographical and autofictional implications in the work ‘O Céu dos Suicidas’, based on the statements expressed by the character/narrator/protagonist Ricardo, and show why she fits into the self-fictional writing genre; to describe the marks of the representation of memory and subjectivity that permeate the work ‘O Céu dos Suicidas’ by Ricardo Lísias, focusing on the aspects that bring it close and distance from trauma and memory; and as specific: to analyze the types of traumas suffered by the main characters in ‘O Céu dos Suicidas’ that were the cause of the changes suffered by the protagonist/narrator/author Ricardo that led him to melancholy and depression in this work. In this sense, we place the work within the scope of studies of the autobiographical genre according to the criteria presented by Philippe Lejeune (2008) and studies on the autobiographical and autofictional pact or ambiguous pact, taking into account the theoretical assumptions of Manuel Alberca (2007) and Philippe Willemart (2009), who focus on creation processes, and Ângela Gomes (2004), who deals with self-writing and self-fiction, in addition to the writing of History, which points to a relationship of violence and power, among others that will help in the investigation process. In the debate on self-fiction, we will rely on the contributions of Alberca (2007), Arfuch (2010) and Costa (2020). On the issue of memory, an indispensable component for the study of self-writing, we will make use of the studies developed by Izquierdo (2013) and Halbwachs (1990), just to name a few that will give us the necessary support to develop the debate on memory, an aspect indispensable for anyone studying the genre of self-writing.

Keywords

Memory; trauma; The Suicide’s Heaven ; Ricardo Lisias


A gênese desta pesquisa se deu a partir das discussões teóricas sobre autobiografias desenvolvidas em aulas com uma professora do Mestrado acadêmico em Letras da UFPI ainda no início do ano de 2019, a professora doutora Margareth Torres de Alencar Costa, quando fizemos a disciplina Crítica Literária como aluno ouvinte, nascendo então o interesse por aprofundar estudos sobre a escrita de si e as obras que são objeto de estudo deste trabalho.

O presente estudo propõe uma investigação da representação da memória e trauma na obra O céu dos suicidas (2012), de Ricardo Lísias. Nessa perspectiva, empreende-se a hipótese de que pessoas que compartilham amizade ou sentimentos com pessoas próximas, como amigos e parentes, e não conseguem evitar que se suicidem ou que sejam presas ou torturadas, desenvolvem um profundo sentimento de culpa e caem na depressão, isso partindo da perspectiva da autoficção.

Assim, o problema desta pesquisa é: Porque o personagem principal do romance O Céu dos Suicidas desenvolve profundas marcas de melancolia que só são superadas através da exorcização de sua dor, como é o caso do personagem principal da referida obra literária de autoria de Ricardo Lísias? Ricardo Lísias nasceu no dia 07 de julho de 1975 em São Paulo. Como escritor, estreou em 1999 com o romance Cobertor de estrelas quando ainda era aluno do Curso de Letras na Unicamp. Chegou a ser finalista do prêmio Jabuti em 2008, com o romance Anna O embora tenha concorrido com outros romances também, e foi finalista do Prêmio São Paulo de Literatura em 2010, com O livro dos Mandarins.

O escritor foi um dos vinte selecionados para a edição da revista Inglesa Granta que apresentou, na ocasião, os melhores jovens escritores brasileiros, entre os quais estava Lísias, e na edição brasileira desta revista publicou o conto “Tólia”. Nas versões que circularão no exterior, irá apresentar o texto “Evo Morales”.

Desde então, o autor colabora com textos de ficção em diversas publicações e é autor de romances, novelas e livros infantis. Durante bate-papo mediado por Rogério Pereira no Teatro Paiol, em Curitiba realizado dia 18 de abril de 2012, Lísias falou sobre seu recém-lançado romance, O céu dos suicidas, sobre a relação entre cultura e educação, vulgaridade na literatura, elementos biográficos na ficção, tematização de assuntos relevantes e espinhosos e a literatura como enfrentamento dos discursos dominantes. Identificamos alguns artigos nos quais os autores já fazem a análise da obra de Ricardo Lísias partindo dos conceitos de texto autoficcional.

Então, coube a este pesquisador verificar se os biografemas (que são dados biográficos da vida do autor) presentes nos romances e que os configuram ou não como sendo autoficcionais. Fica difícil não os caracterizar como textos pertencentes ao gênero autoficcional, considerando que o próprio Lísias, em entrevista dada quando do lançamento de seu livro, pontuou: “O motor inicial do romance é o suicídio, em 2008, de um dos meus melhores amigos desde o tempo da faculdade. Nessa época, eu estava encerrando outro romance. Eu me vi na situação de ter que continuar escrevendo e não conseguir escrever sobre outra coisa” (LÍSIAS, 2012, s. p.)

Mais adiante, Lísias afirma que escrever sobre temas considerados tabus, como é o caso do suicídio e do divórcio, o levaram a produzir esses dois textos. Nas palavras dele: […] “escrevi dois contos, que foram publicados na revista Piauí, sobre um tema mais tabu ainda que o suicídio — o divórcio” (LÍSIAS, 2012, s. p.).

Ricardo Lísias é reconhecido pela crítica como escritor autobiográfico. Segundo Lejeune (2008), o pacto autobiográfico expõe que o narrador esteja relacionado com uma referencialidade externa que possa ser comprovado.

Em oposição a todas as formas de ficção, a biografia e a autobiografia são textos referenciais: exatamente como o discurso científico ou histórico, eles se propõem a fornecer informações a respeito de uma “realidade” externa ao texto e a se submeter, portanto, a uma prova de verificação. Seu objetivo não é a simples verossimilhança, mas a semelhança com o verdadeiro. Não o “efeito de real”, mas a imagem do real (LEJEUNE, 2008, p. 36).

Nesse sentido, situamos a obra no âmbito dos estudos do gênero autobiográfico conforme os critérios apresentados por Philippe Lejeune (2008) e os estudos sobre o Pacto autobiográfico e autoficcional, ou pacto ambíguo, levando em consideração os pressupostos teóricos de Manuel Alberca (2007) e Philippe Willemart (2009), que enfocam os processos de criação, e Ângela Gomes (2004), que trata da escrita de si e da auto ficção, além da escrita da História, que sinaliza para uma relação de violência e poder, entre outros que auxiliarão no processo de investigação. No debate sobre auto ficção, nos apoiaremos nas contribuições de Alberca (2007), Arfuch (2010) e Costa (2020). Sobre a questão da memória, componente indispensável para os estudos da escrita de si, lançaremos mão dos estudos desenvolvidos por Izquierdo (2013), e Halbwachs (1990), só para citar alguns que nos darão o suporte necessário para desenvolver o debate sobre memória, aspecto indispensável para quem estuda o gênero da escrita de si.

Além disso, por ser um escritor contemporâneo e se enquadrar, de acordo com os estudos que temos efetivado até aqui, no que se caracteriza como escrita auto ficcional, Ricardo Lísias é um dos romancistas que, além de escrever ficções (aqui denominadas de autoficções), teoriza sobre o conceito de auto ficcionalidade em alguns de seus livros. Este estudo se justifica ainda pela necessidade de aporte teórico sobre autoficção, fato que inclui esta pesquisa como necessária para aumentar o número de pesquisadores da escrita autobiográfica na modernidade como escrita autoficcional, residindo também aqui nosso impacto no sentido de contribuirmos de forma teórica para a discussão acadêmica sobre escrita autoficcional.

Um fator muito importante nas narrativas tidas como autobiográficas, um ponto a ser discutido, é a memória. Todos que escrevem sobre si, ou sobre alguma coisa que viram ou sofreram com outros, terão de fazer a recuperação da memória, lembrarem o passado e narrarem presentemente o que viram, sofreram ou vivenciaram para escrever sobre ele.

Halbwachs (1990) é um dos teóricos que apoia nossa pesquisa, principalmente porque ele faz um diálogo entre a memória individual e coletiva, na medida em que nos explica que a memória individual necessita da memória coletiva para reforçar os fatos narrados. Para que nossa memória se auxilie com a dos outros, não basta que eles nos tragam seus depoimentos: é necessário ainda que ela não tenha cessado de concordar com suas memórias, e que haja bastante pontos de contato entre uma e outras para que a lembrança que nos recordam possa ser reconstruída sobre um fundamento comum (HALBWACHS,1990, p.34).

A memória, como podemos verificar, não pode pautar-se apenas nas reminiscências que afloram no pensamento de cada um, ela tem um caráter social, uma vez que é a partir de seus estudos que se pensa em uma dimensão da memória que ultrapassa o plano individual. O testemunho do que eu vivi, e o testemunho de alguém que passou pelo que passei e pode testemunhar que o que eu falei é verdade, é muito importante para que a memória individual não seja desacreditada.

Em se tratando de escrita autobiográfica, Lejuene (2008) foi o primeiro a teorizar sobre o tema, outros escritos surgiram algum tempo depois. Sobre este assunto, deixemos que ele mesmo nos explique.

A autobiografia (narrativa que conta a vida do autor) pressupõe que haja identidade de nome entre o autor (cujo nome está estampado na capa), o narrador, e a pessoa de quem se fala. Esse é um critério muito simples, que define, além da autobiografia, todos os outros gêneros da literatura íntima (diário, autorretrato, auto ensaio). Uma objeção vem logo à mente: e os pseudônimos? Objeção fácil de ser descartada, a partir do momento em que o pseudônimo é definido e diferenciado do nome do personagem fictício (LEJEUNE, 2008, p. 24).

De acordo com este teórico, para que uma obra seja considerada autobiográfica, há uma condição, que é a coincidência entre os nomes: autor, narrador e personagem principal serem a mesma pessoa. Esta condição abrange o que o teórico especifica como sendo condições para que um texto seja reconhecido como sendo texto autobiográfico.

A identidade se define a partir de três termos: autor, narrador e personagem. Narrador e personagem são as figuras às quais remetem, no texto, o sujeito da enunciação e o sujeito do enunciado. O autor, representado na margem do texto por seu nome, é então o referente ao qual remete, por força do pacto autobiográfico, o sujeito da enunciação. (LEJEUNE, 2008, p.36)

Ângela Gomes (2004) desenvolve todo um estudo do ponto de vista da escrita de si, analisando cartas escritas por personagens famosos e alguns historiadores, mas, além das cartas, ela analisa também os diários como textos autobiográficos, e pontua que estas correspondências e diários devem ser estudados do ponto de vista da autoficcionalidade. Com relação à correspondência epistolar, fica fácil verificar a subjetividade e a autoficcionalidade porque, segundo a teórica:

Esse tipo de correspondência, pelos relatos mais minuciosos do cotidiano, pelas questões de saúde discutidas, pelos planos para o futuro revelados e pela afetividade que dela transparece, permite que se acompanhe a construção de uma amizade intelectual, ela própria o principal produto do trabalho epistolar. (Gomes, 2004, p.65).

O trecho ilustrado acima revela o porquê de Gomes (2004) considerar que as correspondências sejam escritas autoficcionais, por conta da subjetividade e o relato de todos os planos de quem escreve, expondo seu presente, fatos passados e expectativas futuras. Costa (2020) afirma que o texto autoficcional é um gênero híbrido que mescla autobiografia com ficção, e que a principal marca da autoficcionalidade consiste em que o autor/narrador é o primeiro leitor de seu próprio texto, lança mão de seus biografemas e, além disso, efetiva rasuras no texto ao tempo em que lê e relê, escolhendo palavras e acontecimentos que podem ser contados ou não. Este exercício também é conhecido como subjetividade do autor que se insere em seu próprio texto e ficcionaliza sua narrativa.

Devido aos argumentos acima sobre a percepção da autobiografia e da escrita de si, faz-se necessário trazer à tona a discussão de Leonor Arfuch (2010) acerca da possibilidade das escritas do eu ocupar um espaço que, para ela, pode ser compreendido como espaço biográfico. Segundo a teórica, as narrativas podem ter um caráter relacional e não de exclusão. É nesse espaço que se pode encontrar obras voltadas para as memórias, os testemunhos, as autobiografias e as autoficções. Para ela, “o espaço biográfico, assim entendido – confluência de múltiplas formas, gêneros e horizonte de expectativas – supõe um interessante campo de indagação” (ARFUCH, 2010, p. 58-59). A partir desse pensamento, observou-se um alargamento de possibilidades para as escritas pessoais, visto que o que tem maior relevância é a presença da relação entre eles, e não da rejeição.

A escrita de si, como uma prática cultural de comunicação entre literatos, intelectuais, ou como exercício aplicado por professores em sala de aula, tem sido uma realidade e uma prática característica da contemporaneidade. Gomes afirma que também diversos historiadores e cientistas sociais estão muito interessados nesta teoria, e esta realidade indica:

[…] a existência entre um novo espaço de investigação histórica- aquele do privado, de onde deriva a presença das mulheres e dos chamados homens comuns, e os novos objetos e metodologias de fontes que vão se descortinando viabilizam que neste espaço privado, que de forma alguma elimina o público, que avultam em importâncias práticas de uma escrita de si. (GOMES, 2005, p.9)

Como é possível verificar, ou mesmo inferir, os textos autorreferenciais vêm ganhando terreno no trabalho de muitos críticos literários, professores, historiadores, arquivistas, só para ilustrar com alguns exemplos. Assim, as práticas consideradas biográficas – nas quais os indivíduos relatam fatos relacionados com suas próprias vidas de maneira geral, não apresentam qualquer característica excepcional para serem lembradas, como é o caso de nosso objeto de estudo. Os leitores de Ricardo Lísias se deparam com dois textos nos quais as paixões humanas, as perdas, as emoções fortes do dia a dia estão narradas em primeira pessoa, como é o caso de O céu dos suicidas – no qual se narra a história do suicídio de André, melhor amigo do narrador/autor/personagem principal. No outro texto, os leitores se deparam com Lísias que, ao encontrar o diário da esposa após quatro meses de casados, descobre, perplexo que a esposa confessa não o amar mais e que já o traíra. Os leitores de O Divórcio acompanham a dor e a depressão e, enquanto leem, se deparam com um sujeito que perde a identidade e fica planejando e pondo em práticas estratégias de reconstrução de sua identidade fragmentada, a reconstrução do ser social através da rememoração de si, dos fatos e dos seres que o rodeiam.

O que faz com que as histórias narradas sejam de fato narrativas de si, ficcionalizadas por seu caráter carregado de subjetividade, é o fato de a sociedade se enxergar ali, a empatia, o já ter vivenciado a mesma dor.

No que tange à memória, não há, nos textos analisados, fatos históricos. O que mais observamos é a presença da memória individual, pois, como nos esclarece Gomes (2004, p. 13), “uma sociedade em cuja cultura importa aos indivíduos sobreviverem na memória dos outros, pois a vida individual tem valor e autonomia em relação ao todo. É dos indivíduos que nasce a organização social e não o inverso.” Está tudo relacionado entre si, seja a história da subjetividade dos indivíduos, a história das práticas culturais da escrita de si, e a história da História, que obriga os profissionais envolvidos a proporem e a buscarem fontes, metodologias e critérios de verdades históricas, conforme Gomes (2004, p. 14) nos esclarece:

A escrita de si assume a subjetividade de seu autor como dimensão integrante de sua linguagem construindo sobre ela a sua verdade, (…) trata –se de narrativa em primeira pessoa do singular que traduz a intenção de revelar dimensões intimas e profundas do indivíduo que assume sua autoria.

A escrita de si trata de escrever sobre si mesmo, como o próprio nome já diz: é uma escrita na qual o autor/narrador/personagem se descreve, trazendo detalhes de vivências e características, dele se colocando como personagem principal, do romance ou obra. Nesse conceito sobre escrever sobre si, é bastante comum vermos o autor trazer um relato autobiográfico, a partir do qual ele busca, segundo Lejeune (2008), definir o que é na realidade autobiografia, como sendo a vida de um indivíduo escrita por ele mesmo.

A forma de imprimir sua personalidade, sua vivência, e relatos em seus escritos, sobre sua pessoa e personagem, faz desta escrita uma escrita classificada como “escrita de si”. Dessa forma, Lejeune (2008) define autobiografia como a “narrativa retrospectiva em prosa que uma pessoa real faz de sua própria existência, enquanto focaliza sua história individual, em particular a história de sua personalidade” (LEJEUNE, 2008, p. 14).

A escrita de si possui nuances que são bem diretas, tornando, dessa forma, sua identificação em obras dessa natureza bem características. Nas obras que são objetos deste estudo, do escritor contemporâneo Ricardo Lísias, O céu dos Suicidas e Divórcio, percebemos traços de sua personalidade, bem como o uso dos verbos em primeira pessoa, além de ser o personagem das suas histórias, mesmo que tente, a todo momento, fazer com que o leitor seja levado a pensar o contrário. Lísias nos mostra sua subjetividade e relata vivências, além de usar comparativos por meio dos quais é possível se perceber, quando se lê as duas obras, o nome dos personagens e as citações intercaladas de uma obra na outra. Vemos nelas traços de sua vida, e trechos de relatos pelos quais passaram os personagens das referidas obras, sendo isso uma característica primordial, da escrita de si, como bem explica Lejeune, (2008, p.15): “Para que haja autobiografia (e, numa perspectiva mais geral, literatura íntima), é preciso que haja relação de identidade entre o autor, o narrador e o personagem.” O autor afirma ainda que […] “A identidade narrador-personagem principal, suposta pela autobiografia, é na maior parte das vezes marcada pelo emprego da primeira pessoa.” (LEJEUNE, 2008, p. 16, destaques no original).

De fato, ao colocar o problema do autor, a autobiografia elucida fenômenos que a ficção deixa numa zona de indecisão, em particular o fato de que pode muito bem haver identidade do narrador e do personagem principal no caso da narrativa “em terceira pessoa”. Essa identidade, embora não seja mais estabelecida no texto pelo emprego do “eu”, é estabelecida indiferentemente, mas sem nenhuma ambiguidade, através da dupla equação: autor = narrador e autor = personagem, donde se deduz que narrador = personagem, mesmo que o narrador permaneça implícito, é escrita como uma simples biografia (LEJEUNE, 2008, p. 16).

Também é possível dizer que o autor das obras, Lísias, baseia-se em sua história, a escrita de si tem muito da história contada pelo personagem, mostrando que os relatos, diários, e escritos outros, são documentos que traduzem muito do ser. Dessa forma, corroboramos com Gomes (2005) quando ela afirma que a memória tem uma dimensão seletiva que fortalece essa afirmação de que o presente é um tempo de síntese, que produz diálogos diversos com as outras faces do tempo. Ela possui ritmos, dissonância, harmonias, contrapontos. Não há, portanto, como procurar no diário a memória exata do que aconteceu ou, como afirma Rezende (2004, p. 78-79), “a história é uma interpretação do que sucedeu, não o fato em si como fotografia de um autor anônimo e onipotente, fixa e inalterável”.

A respeito da constatação do personagem, que é reconhecido no texto como sendo autor/narrador e personagem ao mesmo tempo, Gomes (2004, p. 16) constata que havia “a postulação de que o texto é uma ‘representação’ do seu autor, que o teria construído como forma de materializar uma identidade, que quer consolidar”. A teórica, na mesma página. defende que a escrita de si é, ao mesmo tempo, “constitutiva da identidade de seu autor e do texto que se criam, simultaneamente através dessa modalidade de produção do eu”

Assim como Lísias criou um personagem para tratar de seus romances, tanto numa obra como na outra ele tenta relatar ao leitor que, embora o personagem de quem ele trata se parece com ele, não é ele, tentando confundir o leitor, levando-o a pensar que não se trata dele mesmo, como bem nos explica Venancio (2004, p. 134), quando ela cita A Barca de Gleyre, de Monteiro Lobato, texto no qual o autor paulista cria um personagem para falar dele mesmo, de suas próprias aventuras. Esta parte pode ser explorada para fundamentar qualquer outra situação similar em obra de ficção / autoficção.

Outra questão bem interessante, quando se trata de falar de escrita de si, ou escrita autobiográfica, é a questão do autorretrato, mas não se trata aqui de um auto retrato em si, mas de um olhar de si em outro auto retrato, como quando você se ver em outro retrato já retratado. Lejeune (2008, p. 246-247) nos diz que: “Ler a autobiografia de um escritor traz informações novas sobre ele como homem e como artista, abrindo um novo espaço de interpretações para uma leitura ou para uma releitura de seus outros textos”.

A arte de pintar-se a si mesmo, seja através de textos poéticos ou narrativos, ou mesmo fisicamente, não nasceu há pouco tempo, pois, de acordo com Alberca (2007, p. 20), os “primeiros autorretratos, dignos de esse nombre, es decir la representación de la figura del artista, datan del siglo XV y pintores de incontestable valia y originalidad como Rembrant, quien se irá autorretratando assiduamente a lo largo de su vida, quien se irá autorretratando assiduamente a lo largo de su vida”

Entre os muitos escritores, artistas e intelectuais famosos que lançaram mão deste recurso, podemos mencionar: Pablo Neruda, com seu Autorretrato; Manuel Bandeira, com seus poemas carregados de dados biográficos e biografemas; Machado de Assis, que incorporou um de seus personagens em Memorial de Aires; e Lima Barreto, que espelhou sua vida em Memórias do Escrivão Isaías Caminha e Diário do Hospício, entre outros de seus textos. A arte de pintar-se a si mesmo, seja através de textos poéticos, narrativos, ou mesmo através de telas a óleo como, por exemplo, o espelhamento de si, de suas dores e sofrimentos, tem, em Magdalena Carmen Frieda Kahlo Y Calderón, talvez o maior exemplo. Frida Kahlo, como ficou conhecida pelo mundo, nos mostra, através de suas pinturas carregadas de herança materna indígena, seus estados de ânimo, suas dores e penares, não de forma cinza, ou com imagens negativistas, mas tudo muito colorido e florido. Ou o que dizer de Vincent van Gogh, que confessou, em correspondências familiares, que além de não ser fácil descrever ou narrar-se a si mesmo, também não era fácil pintar-se a si próprio; ou o auto retrato de Francisco de Goya com o Dr. Arrieta (1820), quando este o salvara de morte certa em uma pandemia, quando o pintor foi acometido de surdez parcial, tonturas, delírios e, ao ficar bom, eternizou nas telas essa fase dolorida de sua existência.

Na contemporaneidade, ficou mais corrente a elaboração do autorretrato pelos indivíduos modernos, que externalizam e reproduzem suas auto imagens como se fosse a eclosão do narcisismo no século XXI, e este espelhamento tem atraído bastante os leitores modernos, que desenvolvem uma enorme empatia por se reconhecerem ou se sentirem motivados a ler e a sentir a vida do outro. Um dos artistas que mais se aproximou da dor, do desespero, do estresse e do sentimento de angústia e estresse para a tela foi Gustave Coubert (1819-1877) quando pintou a tela “O homem desesperado”, em 1844-45. É recordando esta tela que nós pegamos imaginando o interior do personagem/narrador de O Céu dos Suicidas .

No século XX, os artistas já se dedicam mais a documentar suas vidas, seus percalços em suas obras, seus diários, suas correspondências ou autobiografias, fazendo isso de forma mais autêntica possível, o que levou e leva os teóricos a reconhecerem e partirem do estudo da escrita de si como autoficção, e é assim que este estudo mergulha no tema do espelhamento de Lísias em O céu dos suicidas.

A respeito da discussão da subjetividade do nome do narrador/personagem, Alberca (2007, contracapa) explica que:

Al unísono de la imagen del creador, el concepto de autoría, que ya tenía siglos de existencia, se vio ratificado y reforzado en dos direcciones: el autor será el propietario o beneficiario económico y el responsable civil e interpretativo de su obra. Después de la II Guerra mundial, los creadores, bajo una mayor presión e interés mercantilista, tomaron un derrotero en el que el arte y la literatura quedaron reducidos muchas veces sólo a la difusión a la profusión de la propia imagen, convertidas ambas en objeto artístico.

Alberca (2007) inicia seu livro expondo que todas as obras que analisa para exemplificar sua teoria e defender sua tese são narrativas autoficcionais, preparando assim seus leitores para o que vem a ser uma narrativa auto ficcional:

A las obras narrativas de las que me voy a ocupar a ocupar em este libro cabe considerarlas como imágenes ficcionalizadas de esse imaginário de nuestra época que concibe el fragmentado e inestable sujeto moderno como un hervidero de múltiples yos” (ALBERCA, 2007, p. 20).

Alberca deixa claro que, por muito tempo, a presença do autor nas narrativas em prosa ou foram estudadas como autobiografia, ou rejeitadas, sofrendo duras críticas. Por este motivo, ele resgata a presença do autor nos textos literários, não do mesmo jeito que Philippe Lejeune vem tratando a questão da literatura reconhecida como autobiográfica, mas, como ele mesmo nos explica:

Las autoficciones tienen como fundamento la identidad visible o reconocible del autor, narrador y personaje del relato.  En este contexto, identidad no quiere decir necesariamente esencia, sino un hecho aprensible directamente en el enunciado, en el cual percibimos la correspondencia referencial entre el protagonista y su autor, como resultado siempre de la transfiguración literaria.  (ALBERCA, 2007, p. 31).

Desta forma, constata-se que o teórico reconhece os textos que tratam da escrita de si, não como autobiográfico, mas como autoficcionais. De acordo com o teórico, isso ocorre porque a proposta autoficcional consiste em que muitos escritores, de maneira mais ou menos consciente, confundem pessoa e personagem, e insinuam ou fazem parecer de maneira contraditória que este personagem é e não é o autor.

Um dos teóricos mais conhecidos por criticar a pessoa do autor em detrimento da exaltação do leitor foi Barthes, mas, pouco tempo, depois ele lança sua autobiografia, o que leva Alberca (2007, p. 24) a lhe fazer uma dura crítica:

uma autobiografia que, a pesar de utilizar el ¿desconstructor? E impostado recurso de la tercera persona para hablar de sí mismo, no olvidó adjuntar como certificado de fé de vida el álbum fotográfico familiar, profesional y personal: Roland Barthes por Roland Barthes (1975)”

Roland Barthes. 1969

Barthes afirmava, o tempo todo, que o autor era a expressão da ideologia possessiva e individualista burguesa, e por isso defendia que se tinha que amortizar ou nacionalizar a circulação da obra, preconizando o desaparecimento do sujeito e, ao mesmo tempo, concedendo autonomia literária ao texto e ao leitor.

Algum tempo depois da celeuma que a teoria de Barthes sobre a morte do autor causou, Michel Foucault, em seu texto “O que é um autor?”, tece considerações sobre a função do autor como uma função fundamental, que assegura a compreensão e interpretação do texto. A este esforço, Alberca (2007, p. 27) afirma: “De las cenizas de aquella “muerte” y pese a los deseos de los críticos de hacer desaparecer al sujeto, el autor ha renacido, no sin contradicciones, como sujeto autobiográfico y la nueva ola de biografismo lo atestigua”.

Por conta destas orientações teóricas, os próprios autores têm feito clones de si mesmo, e nós leitores nos deparamos com eles em suas mais variadas formas, o que nos leva a corroborar com Alberca (2007, p. 29):

En cualquier caso, de la figura el cuerpo del autor se obtiene numerosos clones autofictícios, que rompen la divisoria entre lo natural y lo artificial, entre lo autobiográfico y lo ficticio, entre el original y la copia, del mismo modo en que los medios electrónicos de reproducción digitalizada de las imágenes fotográficas, del cine o de internet pierde sentido hablar de copia y original al resultar iguales e indistinguibles.

Na contemporaneidade, há um movimento diaspórico no mundo muito grande, por motivos diversos, que coloca seres humanos em deslocamento contínuo, ou por conta de melhores condições de vida, concursos públicos, a procura por trabalho, por motivo de perseguições políticas, cancelamentos nas redes sociais, conflitos sociais e econômicos no mundo, guerras, movimentando os seres que também têm de lidar com novas culturas, novas formas de ver e se comportar nos novos lugares, e isso vai levando os indivíduos a se desfragmentarem e estarem em constante reconstrução de si. Esta realidade nos textos literários é a semente que faz surgir o que denominamos de autoficção, e o que Alberca (2007, p.31) afirma ser:

Lendo o romance Divórcio, os leitores se deparam com o processo de reconstrução de sua pele e de sua vida. É um verdadeiro tratado sobre um corpo- elemento central do livro O Divórcio, o qual vai sofrendo uma metamorfose gradual à medida que os problemas, que são horríveis no início, vão sendo resolvidos, como ele nos esclarece neste trecho: “Só pode ser ficção. No meu último romance, O céu dos suicidas, o narrador enlouquece e sai andando. Agora, fiquei louco e estou vivendo minhas personagens” (LÍSIAS, 2013, p. 15). Esta é mesmo uma ficção de si, porque, ao lermos O Céu dos suicidas, nos damos conta que o personagem/ narrador em primeira pessoa criado por Lísias é ele mesmo, fato que nos comprova várias vezes na obra, talvez como subterfúgio para ocultar o autor/ narrador de suas mazelas e criar uma confusão mental no leitor de seu texto. Lísias se autorreferência em todas as suas obras, como uma marca de sua construção literária.

Bruna Santos Pereira, em sua dissertação Nas redes e na literatura: Internete e autoficção em Delegado Tobias, também trata do processo de autoficção nos textos produzidos por Ricardo Lísias. Esta pesquisadora trata particularmente da forma como Ricardo Lísias lança mão das redes sociais para divulgar sua obra e as autopromove e chega ao ponto de escrever Delegado Tobias totalmente nas redes sociais.

Para Pereira (2019, p. 10), “A conexão da autoficção com o suporte digital e a interação do leitor com o texto (gerando inclusive, uma denúncia contra o próprio autor …)”, fazem de Lísias um autor intrigante. Lísias é um escritor ativo nas redes sociais, mantendo perfil e conta pessoas no Facebook, Twitter, e perfil no Instagram, muito fáceis de serem encontrados, bastando que qualquer estudioso do autor acesse sua atuação online e terá uma ideia de seu perfil.

Nestas redes sociais, o escritor divulga seus trabalhos, incluindo suas participações em todas as atividades acadêmicas que vai efetivando como, por exemplo, lives, palestras, divulgação de seus livros, sendo o mais recente deles Diário da Cadeia, com trechos inéditos da obra Impeachment (2016), que foi escrito sob o pseudônimo de Eduardo Cunha. Embora o verdadeiro Eduardo Cunha tenha entrado com um processo para impedir a venda do livro e sua divulgação, a editora Record recorreu da decisão e o livro foi lançado e vendido.

Nessa esteira de pensamento, concordamos com Pereira (2019, p. 30) quando ela aponta três dimensões do estilo de Ricardo Lísias: “O Ricardo Lísias autor e personagem de seus livros; O Ricardo Lísias escritor, que participa do debate literário como agente desse campo e o Ricardo Lísias cidadão pessoa física e figura pública que expõe suas opiniões”.

Estas afirmações nos levam a corroborar com Klinger (2006, p. 26), quando ela afirma que “a autoficção só faz sentido se lida como show, como espetáculo, ou como gesto”. A autoficção em Lísias trata de textos narrativos nos quais os eventos narrados são fatos reais vividos pelo autor/personagem principal carregados de ficcionalidade e ações que apelam ao pathos dos leitores.

O texto O céu dos suicidas é uma narrativa reconhecida pela crítica como sendo texto autobiográfico. No entanto, pela discussão que estamos efetivando neste estudo, fica comprovado que os referidos textos são pertencentes ao gênero autoficcional porque mesclam, como vimos discutindo até aqui, a realidade com a ficcionalidade. Nesse texto os leitores se deparam com o autorretrato psicológico de um personagem/narrador em primeira pessoa que leva os leitores a desenvolver uma reflexão sobre a dor da perda.

Perdas são processos comuns e recorrentes nas vidas dos seres humanos e nesta obra nos deparamos com um tipo de perda que aproximam os seres humanos de problemas psicológicos, como o suicídio do melhor amigo. Este tipo de perda causa desordens e desequilíbrios, podendo os envolvidos apresentarem desorganizações físicas e psicológicas, como é o caso de Lísias quando sabe do suicídio de André, seu melhor amigo. Como viver um luto em uma situação como esta? André havia dado sinais de depressão e da melancolia do que estava prestes a acontecer, mas seu amigo Lísias não se deu conta.

Como consolar-se? Como buscar o equilíbrio diante da dor? Havia o sentimento de não aceitação da realidade da perda. Como recuperar o equilíbrio? Então, os leitores se depararam com um personagem alterado e que não quer ser consolado, porque o amor não mais existe em nenhum dos casos.

De novo, começo a chorar. Não consigo resistir. Estou chorando porque o André se enforcou uma semana depois de ir embora da minha casa. Choro porque falei que na minha frente ele não iria se cortar. Na minha casa, não. Estou chorando nesse hospício chique porque só fico nervoso. Nesse hospício chique. Fico nervoso e ao mesmo tempo me sinto um fraco. E choro porque não entendi nada (LISÍAS, 2012, p. 33).

Neste emaranhado de dor e sentimento de perda, o indivíduo entra em confusão mental, o espírito fica triste e conturbado, o sujeito fica deprimido, sufocado e procurando desesperadamente uma saída para sua dor.

Eu chorava lembrando as ideias dele sobre os templários, como ele se dizia um grande professor, ele era muito novo e foi para o hospício, meu grande amigo, mas eu chorava sobretudo porque sozinho, muito sozinho com a sujeira escorrendo pelo ralo do banheiro de um hotel do Líbano, tinha acabado de descobrir quem eu sou de verdade: um bosta, deixei meu grande amigo André se enforcar (LISÍAS, 2012, p. 69).

Sobre o tema do trauma, violência e decadência humana presentes nos textos autobiográficos e autoficcionais, do ponto de vista de estudos psicológicos acerca da memória, Izquierdo (2002, p. 8) esclarece que ela é a “aquisição, a formação, a conservação e a evocação de informações.” Partindo desta premissa, de que a memória pode inserir e diminuir traços importantes dos fatos, os conceitos a respeito da memória e trauma conduzem à problemática de localizar como o trauma está presente na literatura de Ricardo Lísias, com os fatos históricos, para que o esquecimento não prevaleça sobre os vencidos.

Cândido (2006, p. 20) afirma que a literatura “como fenômeno de civilização, depende, para se constituir e caracterizar, do entrelaçamento de vários fatores sociais.” Logo, inclui-se dentre estes a história, que irá juntar-se aos outros constitutivos da produção literária. Émile Durkheim, um dos teóricos que servirá de base teórica para este estudo, conceitua o atentado contra a própria vida: “Chama-se suicídio todo caso de morte que resulta direta ou indiretamente de um ato positivo ou negativo, realizado pela própria vítima e que ela sabia que produziria esse resultado” (DURKHEIM, 1988, p. 14).

Recorre-se também aos estudos de Ricoeur (2007) para elucidar a definição do termo memória e suas nuances. Ele chama a atenção para o fato de a memória e a história estarem juntas, ainda que de modo conflitivo. A memória dos fatos interessa para a compreensão, reflexão e releitura da História. Ricoeur (2007, p. 101) compreende que “o dever da memória é o dever de fazer justiça, pela lembrança, a um outro que não a si […] O dever de memória não se limita a guardar o rastro material, escrito ou outro, dos fatos acabados, mas entretém o sentimento de dever a outros.” Ou seja, tendo a memória o dever de rememorar circunstâncias individuais e coletivas perante as vítimas, as memórias coletivas se debatem por justiça. A ficção escrita por Ricardo Lísias dá conta desta questão ao pôr na boca do personagem narrador de sua obra ficcional, a recordação de toda sua vida, na tentativa de analisar o que levou seu amigo André a cometer suicídio

A contribuição de Seligmann-Silva (2003, p. 49) sobre como a memória do trauma se converte em narrativa, relatada pelos personagens de Lísias, comprovando que a narrativa é, também, o meio pelo qual o escritor busca o “compromisso entre o trabalho de memória individual e outro construído pela sociedade”. A narrativa estaria, dessa maneira, colaborando na construção da memória coletiva, seja global ou grupal, da qual fala Halbwachs (2006). Para ele, a memória coletiva tem como função essencial fazer com que as pessoas expressem a sensação de pertencimento a um grupo, segmento, instituição. Ela garante um sentimento de identidade ao indivíduo calcado não só no campo histórico, mas também das representações e símbolos.

O silêncio é um elemento característico, não só por ser oposto à memória, mas, sobretudo, porque faz parte do complexo processo da construção da memória. Para Seligmann-Silva (2003, p. 53), a memória, assim como a língua, com seus atos falhos e silêncios, não existe sem a resistência. É nessa tensão, entre memória e esquecimento, que a narrativa se constrói: “A memória só existe ao lado do esquecimento: pois um complementa e alimenta o outro, um é o fundo sobre o qual o outro se inscreve”. Portanto, os silêncios e os esquecimentos, provenientes do trauma, são ícones relevantes de manipulação da memória coletiva. A respeito dessa conexão entre experiências pessoais e coletivas, Cândido (2006, p. 57), ao discorrer sobre a criação literária, afirma que ela não pode “ser desligada do contexto, — isto é, da pessoa que as interpreta, do ato de interpretar e, sobretudo, da situação de vida e de convivência”. Seguindo esse mesmo pressuposto, Halbwachs (2006) também afirma que o sujeito é um instrumento das memórias do grupo, mesmo quando está rememorando sozinho.

Nossas lembranças permanecem coletivas e nos são lembradas por outros, ainda que se trate de eventos em que somente nós estivemos envolvidos e objetos que somente nós vimos. Isto acontece porque jamais estamos sós. Não é preciso que outros estejam presentes, materialmente distintos de nós, porque sempre levamos conosco certa quantidade de pessoas que não se confundem. Dessa forma, para que a lembrança seja reconhecida e reconstruída pelos sujeitos sociais, ele precisa de marcas de proximidade com o grupo a qual pertence. Não se identificando com o coletivo, não ocorreria o processo de rememoração. Ou seja, o indivíduo é uma configuração múltipla, engendrada na intersecção entre diversas forças sociais. Assim Tiburi (2004, p. 51) começa nos explicando que:

O sujeito é o corpo gestado na modernidade. Em sua variada aparição, todavia a marca mais definitiva desse corpo é a ausência de corpo: o sujeito existe não apenas como construído, mas como algo negativo, seu ser se dá pelo esquecimento, recalque ou negação da modernidade, tornou-se um lugar comum dizer que a questão da subjetividade é moderna, que a inserção do indivíduo em seu meio social antes do séc. XVI se dava sob outros laços e papéis que o da suposição de uma dimensão privada e particular pertencente apenas a um único indivíduo e dele inarredável desde o ponto da demarcação de uma própria consciência de si, de um saber de si mesmo”.

O estudo memorialístico é importante, porque apresenta diversas partes da obra em que personagens rememoram as experiências traumáticas vividas individual ou coletivamente. Estas experiências, presentes na obra, revelam personagens angustiados com a situação desumana a qual são submetidos e podem caracterizar as lembranças do convívio familiar, que retornam à mente do narrador. A memória coletiva é formada por lembranças dos indivíduos, ou seja, de vários grupos no qual ele faz parte. Esta realidade confirma o que Halbwachs (2006) afirma sobre a importância dos testemunhos, em que a confrontação de vários depoimentos dá uma maior validade a memória. O autor menciona que nossas lembranças têm maior relevância no coletivo:

Fazemos apelo aos testemunhos para fortalecer ou debilitar, mas também para completar, o que sabemos de um evento do qual já estamos informados de alguma forma, embora muitas circunstâncias nos permaneçam obscuras. Ora, a primeira testemunha, à qual podemos sempre apelar é a nós próprios. (HALBWACHS, 2006, p. 16).

A melancolia é uma característica bem típica de uma pessoa com um ar depressivo. Assim é o personagem de Ricardo nos dois romances que busco analisar nessa investigação. Tiburi (2004, p.42) nos esclarece o comportamento do sujeito em estado de depressão, do sujeito que se sente deslocado e sem chão, incapaz de sentir alegria, e cuja dor transcende para o exterior de seu corpo e se externa em seu rosto:

O melancólico é um sujeito tenso em sua existência evidente e sua morte a cada momento sentida. A teoria que é máxima elaboração do melancólico, brota da dor, da experimentação com o objeto que é a própria interioridade lenhada no memorial da experiência de existir. O melancólico é o sujeito fendido pelo objeto que cataloga e classifica o mundo ao seu redor, desde as coisas até os pensamentos. Um melancólico recolhe o que pode para preencher seu vazio, à procura de vera coisa que responda a todas as suas perguntas como o que preenche todos os vazios (TIBURI, 2004, p. 42).

A leitura atenta dos dois textos escritos por Lísias, O Céu dos suicidas, nos permite ver que o personagem/narrador dá o testemunho da melancolia in crescendo, da doença mental se apoderando da mente de um sujeito à beira da destruição dos laços que o prendiam a vida. Para fugir do destino do amigo André, o narrador/personagem monta estratégias de escapar da situação triste e vazia, da loucura e do sentimento de se matar.

A leitura do livro organizado por Marcio Seligmann-Silva, que trata da literatura do testemunho, muito nos ajudou a entender como a literatura é interdisciplinar, porque ela revela e trata da historiografia, da identidade, e da cultura, e os sujeitos que dão seu testemunho sobre a dor e o trauma da perda estão todos inseridos na sociedade. Seligmann-Silva (2003, p.8) afirma que:

O testemunho deve ser compreendido tanto no sentido jurídico e de testemunho histórico (…), como também no sentido de sobreviver, de ter-se passado por um evento- limite, radical, passagem essa que foi também, um atravessar a morte que problematiza a relação entre a linguagem e o real.

No caso de Ricardo Lísias, em suas obras autoficcionais de cunho testemunhal, nos deparamos com o testemunho da dor da perda (o luto), a proximidade da morte e a própria morte, morte da alma, que leva também à morte física e não somente ao testemunho da denúncia e reportagem.

Tanta autoindulgência está me incomodando. Até o suicídio do meu grande amigo André, nunca tive vontade de voltar atrás com nada. Agora, comecei a sentir saudades de tudo. Como não consigo deixar de relembrar uma quantidade enorme de episódios da minha vida, é inevitável que comece a pesá-los. Então, arrependo-me de muitos (LISÍAS, 2012, p. 16).

 Nesse ponto, vemos que Lísias busca se prender a algo que o suporte e o mantenha de pé, mesmo em frente às adversidades que seu personagem enfrenta, tanto em uma obra como na outra. No caso de O céu dos Suicídas, ele é Ricardo, professor e amigo de André, que, na vida real como na obra, percebe-se que é um personagem trazido da sua vida pessoal para a obra que escreveu. Foi uma forma que ele encontrou para desabafar suas angústias, suas magoas, pela perda desse amigo, que sofre de transtornos mentais, o que o leva a cometer suicido, fazendo com que Ricardo tome esse fato como sendo ele o causador dessa tragédia, ele o responsável pela perda brutal do seu melhor amigo. Isso faz com que ele busque meios para esconder sua dor com viagens ao exterior, coleções de selos e de outros objetos, como uma forma de buscar esconder seu trauma, sua depressão por esse fato. Tiburi (2004, p. 42) nos explica:

E todo esse trajeto de comportamentos e truques configura um método que duvida de si enquanto compõe-se como aposta no outro. A melancolia é a fuga do niilismo, uma fuga de sua própria lama. Por isso, ela se põe à depressão, pois ela duvida da certeza e da dúvida que se eleva à certeza. A melancolia aparece no terreno negro do sem sentido da existência. A certeza que a nutre é a do vazio de tudo.

O sujeito Ricardo, escritor e ser humano, é descrito ou descreve a si mesmo em seus personagens, imprimindo sua subjetividade nas páginas de seus livros. Ao passo que percebemos o teor de sua melancolia, também se percebe o que se passa em cada trecho que ele descreve, seja em uma obra, como na outra. No caso de Divórcio, Ricardo vai descrevendo sua trajetória de vida de casado a pouco tempo, há apenas quatro meses, um tempo não muito longo para a vida que poderia ter pela frente, mas, logo ao iniciarmos essa leitura, já começamos percebendo o trauma ali instaurado pela descoberta feita por ele em seu apartamento de um diário, que seria de sua companheira, cujas páginas, ao folhear e descobrir seu conteúdo, ele se vê deixa completamente averso àquela situação. Ele se recusa a aceitar que se tratava de sua mulher falando dele, da vida deles, de como ele era, dela mesma, de coisas que fez e que pensava que até então ele não tinha conhecimento, de que seria tão terrível assim para ela conviver com tudo aquilo de uma maneira que estivesse tornando a convivência deles insuportável para ela.

Senti que tinha caído no chão. Não me lembro do impacto. Não faz diferença. Estendi o braço direito e ele se chocou com a cama. Ardeu porque meu corpo estava sem pele. O caixão continuava ali. De alguma forma, meu queixo acertou o joelho esquerdo. A carne viva latejou e ardeu. Como o choque foi leve, não durou muito. A sensação de queimadura também passou logo. Mesmo assim, meus olhos reviraram. Alguns desses movimentos são claros para mim. Estão em câmera lenta na minha cabeça (LISÍAS, 2013, p. 8).

A melancolia não é, portanto, uma tristeza sem causa e simples, nem a alegria, como fato da existência diante da constatação do caráter comum do sofrimento. Diferente de um não-ter-causa, a melancolia é a causa, posta que está como idéia fantasmagoricamente elevada sobre o sujeito, fenômeno, estigma que é, ao mesmo tempo, verdade irredutível e ancestral, asa negra de um abutre a obscurecer a face, o signo da consciência do melancólico, esse anjo de olhar abandonado e desviado de tudo, assim como mostram os personagens das duas obras em questão analisadas aqui neste artigo.

Logo depois do divórcio, um dos meus maiores problemas foi o ar. Na rua, respirava fundo e o fôlego não atravessava a garganta. Achei que, caminhando rapidamente, meu tórax se comprimiria um pouco. Fiz força, mas não deu certo. Voltou-me à cabeça o meu cadáver no cafofo (LISÍAS, 2013, p. 8).

É patente como conseguimos perceber os traumas deixados no personagem e também ser real dos romances de Ricardo Lísias. Recordando Walter Benjamin, o narrador/personagem nas duas obras buscava a empatia dos leitores através de um pacto dialógico, procurando dar um tom confessional nestes dois textos, exigindo uma reflexão, um exercício de abrir-se ao outro – eu falo e você me escuta, no qual ele deixa transparecer sua subjetividade.

A guisa de conclusão faço uma pequena afirmação: A luta de Ricardo para conseguir superar seus traumas é visível, pungente e percebida muito bem quando confrontamos as duas obras. Em uma, ele descreve seus subterfúgios para conseguir superar a morte do seu amigo André;

Peguei a agenda e anotei o que havia de mais urgente para aquele dia. Tenho-a até hoje, seis meses depois. Preciso dar aula, confirmar a viagem ao Recife e, a todo custo (escrevi mesmo “a todo custo”), retomar O céu dos suicidas. No dia seguinte, mandaria finalmente meu conto para concorrer a um lugar na revista Granta que selecionaria os vinte melhores escritores brasileiros com menos de quarenta anos (LISÍAS, 2013, p. 42).

Lísias estava bastante perturbado com tudo isso. Nesse contexto, o uso da memória se faz necessária para que possamos compreender a situação pela qual ele estava passando, para percebermos a forma como o ser humano, mesmo um completamente traumatizado, se sente quando se encontra frente a situações como essa. Ivan Izquierdo, estudioso do assunto, nos explica um pouco mais: “Nosso cérebro “lembra” quais são as memórias que não quer trazer à tona, e evita recordá-las: as humilhações, por exemplo, ou as situações profundamente desagradáveis ou inconvenientes” (IZQUIERDO, 2002, p. 1).

Um trauma sempre deixa muitas marcas. Nos casos desses romances que estamos analisando, ele deixou algumas bastante profundas. No livro O Céu dos Suicidas, no qual o melhor amigo André do narrador/autor comete suicídio, ele se culpa bastante pelo acontecido e se martiriza também, tudo consequência de traumas sofridos com a perda desse grande amigo, como podemos observar nesse trecho:

Comecei a chorar no meio de todos eles porque coloquei um apelido no André. (…)O meu amigo se enforcou. Não paro de chorar porque o André tinha se enforcado, porque só fico nervoso e porque todo mundo diz que quem se mata não vai para o céu. Não consigo parar de chorar agora” (LISÍAS, 2012, p. 33.).

Isso tudo é apenas uma parte do sofrimento pelo qual o narrador/autor/protagonista de nossos objetos de estudo passou, relatando-nos pouco da sua vida pessoal através de um contexto autoficcional para que possamos compreender como se dar esse processo de rememoração pós traumático, como bem nos explica Seligmann-Silva (2003, p. 49): “Trauma é a repetição constante, alucinatória, por parte do traumatizado, da cena violenta: a história do trauma é a história de um choque violento, mas também de um desencontro com o real”.

André, de O Céu dos suicidas, é um maníaco-depressivo, têm consciência de sua doença, e a externa de várias maneiras: interna-se por vontade própria, procura ajuda com psiquiatras, analistas, terapeutas, externa seus problemas patológicos e por fim, tudo nos é descrito pelo narrador Ricardo, seu melhor amigo, que externa seu derradeiro ato, resultado de uma longa enfermidade mental, e por desespero, uma grave enfermidade psicológica, causa pela qual a vida se resumia em dor e sofrimento.

O autoaniquilamento, a subjetividade atormentada pelos atos depressivos, e as tentativas de cura da melancolia, daquela tristeza profunda, causa o horror de se ter que viver com a dor da perda, qualquer que seja ela, pela qual o indivíduo fica fora de si, principalmente se as perdas são do tipo de morte por injustiças sociais, como mães e pais que perdem seus filhos para a violência, as perdas afetivas no que diz respeito a separações, traições  extraconjugais, ou suicídios, como é o caso de André, melhor amigo de Ricardo Lísias na vida real, comprovando que não se pode viver contando com o amanhã, porque não nos é dado saber o que acontecerá nem daqui a uma hora que dirá o amanhã.

Referências

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NOTA

* Wilson Cavalcante Costa Junior

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