Estado Patrimonialista e privatização do espaço público no México, sob a perspectiva de Octavio Paz.

Ival de Assis Cripa *

 

Izquierda: Octavio Paz

 

Resumen **

O artigo aborda os ensaios de Octavio Paz sobre a história do México.  Recuperam-se, nesses ensaios, as interpretações do poeta mexicano sobre a permanência da herança colonial espanhola, entendida como um traço marcante do passado mexicano e por extensão, da história latino-americana. Visa-se demonstrar como, sob ótica de Paz, o México e outros países da América Latina, carregam incrustados em sua cultura política, as marcas do Estado Patrimonialista Ibérico, o que implica na confusão entre a esfera pública e a esfera privada, no âmbito das relações estabelecidas entre Estado e sociedade.

 

* * *

 

 

 

A leitura dos ensaios de Octavio Paz sobre a história do México revela uma constante preocupação do poeta e ensaísta mexicano com o tema das múltiplas temporalidades que são constitutivas da história do México. Na obra Tempo Nublado, Octavio Paz relaciona a concepção de tempo dos antigos maias com a dos “historiadores franceses”, que trabalham com o conceito de “longa” e “curta” duração.[1] A longa duração, afirma Paz, designa os grandes ritmos que alteram as estruturas através de modificações imperceptíveis, levando a cabo irreversíveis transformações sociais. E a segunda, a curta duração constituiu o domínio do acontecimento, a história das guerras e revoluções e do nascimento e queda dos Estados. O fragmento citado adiante permite explicitar como o poeta mexicano concebe a relação entre o tempo e a história:

 

 

«Com freqüência se compara a história a um tecido, trabalhado de muitas mãos, que, sem se ajustar e não sabendo exatamente o que fazem, mesclam fios de todas as cores até surgir sobre a tela uma sucessão de figuras ao mesmo tempo familiares e enigmáticas. Do ponto de vista da ‘duração curta’, as figuras não se repetem: a história é criação incessante, novidade, o reino do único e singular. Do ponto de vista da ‘duração longa’, percebem-se repetições, rupturas, recomeços: ritmos. As duas visões são verdadeiras.»[2]

 

 

No ensaio Tempo Nublado, Octavio Paz aborda o problema do tempo na história, fazendo menção ao movimento de revisão dos pressupostos da pesquisa historiográfica empreendido pelos historiadores ligados à Revista Annales d´Histoire Économique et Sociale, fundada em 1929, pelos professores Marc Bloch e Lucien Febvre, cuja revisão da idéia de temporalidade na história é central. Como sabemos, o movimento da nouvelle histoire, iniciado por Lucien Febvre e Marc Bloch, marcou uma profunda mudança na compreensão da noção de tempo e realizou uma revolução no conhecimento histórico. Segundo José Carlos Reis, a vitória do tempo longo na pesquisa historiográfica levou mais de 50 anos para ocorrer e, ainda hoje, não pode ser considerada uma perspectiva dominante entre os historiadores. A compreensão da história como um processo único, presa ao tempo homogêneo e vazio da modernidade, persiste:

 

«A vitória do tempo longo em história, que é o que significou o movimento da nouvelle histoire, não foi súbita, não foi clara, não foi visível, não foi indiscutível (…). As perspectivas de Febvre e Bloch não coincidem plenamente e a de Braudel se distingue das dos fundadores e das dos seus predecessores. O que têm em comum é a construção da pesquisa histórica dentro do quadro do tempo longo, que consiste em um esforço de superação do evento e de seus corolários: a história contínua, progressiva e irreversível da realização de uma consciência humana capaz de uma reflexão total. (…) No tempo histórico da nouvelle histoire, há uma consciência opaca, uma consciência natural, uma consciência inconsciente, que possui algumas das características do tempo natural: constância, regularidade, repetição, ciclos, homogeneidade, comparatividade, quantidade.»[3]

 

 

Sob muitos aspectos, a obra de Octavio Paz reporta-se aos processos de longa duração na América Latina. Em especial, Paz faz referência às marcas da conquista e da colonização espanhola, que podem ser tomadas como permanências vinculadas ao tempo “longo.” Um aspecto dessas permanências, que marcaram a cultura política mexicana e latino-americana, seria a permanência do Estado Patrimonialista, um dado de longa duração e que faz parte da tradição ibérica, herdado desde a organização do sistema colonial. Tradição patrimonial cujas principais características, durante a colonização, foram: a existência de um exército profissional em que os naturais da terra estavam excluídos do alto comando, uma atitude perante a lei, marcada não pela noção de legalidade ou ilegalidade, mas pelo princípio determinante da graça. Na sociedade patrimonial, cabe ao “bom rei” – que é vigário de Deus na terra e senhor natural da mesma -, estar atento para punir os maus e recompensar os justos:

 

“Sendo distribuidor de patrocínio, ele recompensa os serviços dos vassalos merecedores com cargos e honras, de acordo com um sistema cuidadosamente regulamentado pelo qual, teoricamente ao menos, cada servicio de um vassalo recebe a devida compensação numa merced, ou favor, do rei”.[4]

 

Trata-se, afirma Elliott, de uma sociedade organizada em torno das idéias de obrigação mútua, e de servicio y merced, num modelo de sociedade que havia sido desmantelado na Idade Média e que fora reconstituído por Castela, durante o Reinado de Fernando e Isabel (1474-1504). Após sua reconstituição, o modelo patrimonial foi implantado no continente americano. Os reis católicos Fernando e Isabel, “eram os governantes do que era essencialmente uma sociedade medieval renovada. Mas a natureza do próprio reinado desses soberanos, embora tradicional em suas formulações teóricas, possuía na prática elementos de inovação que tornavam seu poder mais temível que o de qualquer de seus antepassados medievais.”[5] Octavio Paz cita o exemplo de Sor Juana, que ao pedir ao Vice-Rei pela vida de um condenado, o faz apelando para o poder “divino” do Vice-Rei de dispor sobre a vida de alguém: “Morte pode dar a alguém qualquer um, mas vida, só Deus pode criar: Então, somente em conceder a vida, Vós podeis com Deus se parecer”.[6]

 

O poder do príncipe cristão não era como o dos presidentes, a encarnação da lei, afirma Paz: era um desígnio divino. Na sociedade da Nova Espanha, o príncipe considera o governo seu “patrimônio privado”, afirma Paz. Algumas disposições da Metrópole limitavam o poder do Vice-rei, mas não negavam o caráter patrimonialista de seu governo.[7] Esse poder reproduzia as características e as estruturas do regime patrimonialista da Metrópole. As marcas desse regime permanecem na cultura política mexicana e Latino Americana. Octavio Paz interpretou essa herança colonial do ponto de vista da permanência de um tempo que não passou:

 

“Em um mundo de hierarquias fixas, mas sujeitas às mudanças ditadas pela graça ou o capricho do governante (….). As benesses dos governantes aos súditos eram presentes e favores que podiam consistir na concessão de um cargo público, ou  em outorgar o perdão a um réu. Os cargos e os favores podiam ser comprados, de forma direta junto à autoridade ou, mais freqüentemente, por meio de intercessores como os validos e protegidos”.[8]

 

Num regime patrimonial, afirma Octavio Paz, a autoridade central devia estar sempre alerta para impedir o crescimento excessivo de una aristocracia independente de “terratenentes”, que se beneficiava dos privilégios hereditários, impedindo assim o ressurgimento do feudalismo. Segundo Paz,

 

“Na Nova Espanha, a autoridade central seguiu sempre com receio as atividades dos criollos. Sob essa perspectiva, a polêmica entre espanhóis e criollos, iniciada após a conquista, foi uma conseqüência natural do patrimonialismo espanhol.”[9]

 

No patrimonialismo espanhol, afirma Paz, o vice-rei é o alter ego do monarca na colônia e uma sorte de primeiro ministro, pois acumula o cargo de chefe de governo, (encarregado da administração) de capitão geral (destinado a cuidar dos assuntos militares), o cargo de presidente da Real audiência e de administrador da justiça,

 

“Essa ambigüidade de funções e jurisdições e atribuições não era acidental: correspondia ao caráter patrimonialista da monarquia espanhola e tinha por objeto acentuar a dependência dos vices reis espanhóis.”[10]

 

Nesse tipo de regime, afirma Paz, o príncipe deve assegurar-se da lealdade de seus servidores, principalmente no caso espanhol, em que as autoridades governam em seu nome territórios extensos e distantes da sede do poder central:

 

“Pela a extensão de seus domínios, os monarcas espanhóis  estavam particularmente expostos a esta ameaça. Assim, os vice reis duravam  pouco em seu cargo, sem dúvida para não dar tempo às ambições de urdir tramas.”[11]

 

Segundo Octavio Paz, o Vice-rei tinha uma margem de manobra, para expressar ao Rei suas opiniões, recomendar certas disposições ou contradizer as ordens que eram enviadas. A dificuldade de controle das colônias por parte da Metrópole criava uma situação em que colocava em prática na Nova Espanha a fórmula: a lei acata-se mas não se cumpre. O regime político patrimonialista, instituído na Nova Espanha, era um intricado tecido de influências, poderes e jurisdições:

 

“Frente ao poder político e judicial do vice-rei e da Audiência, havia o poder moral e religioso do arcebispo de México. O arcebispo tinha, por sua vez, como rival o bispo de Puebla, outra grande cidade. E ambos tinham que enfrentar  as poderosas ordens religiosas. As querelas entre os príncipes da Igreja poderiam  ser terríveis…”[12]

 

No final de sua vida, acossada pela inquisição, Sor Juana pode sentir na pele o peso das disputas pelo poder entre os membros da Igreja na Nova Espanha, afirma Paz.

 

A temática do Estado na América Latina e de seus traços patrimonialistas foi abordada na obra “El Ogro Filantrópico.” No livro, Octavio Paz afirma que apesar da onipresença do Estado no continente latino-americano, durante o Século XX, o interesse pelo assunto ficou em segundo plano, diante da obsessão dos críticos com relação ao tema do “subdesenvolvimento” e da “dependência.” E, mesmo na literatura crítica que não se restringe à América Latina, o tema renasceu tardiamente, no final do Século XX.:

 

recentemente renasceu a crítica do poder e do Estado. Penso sobretudo na França, Alemanha e Estados Unidos. Na  América Latina o interesse pelo Estado é muito menor. Nossos críticos seguem  com a obsessão diante do tema da dependência e do subdesenvolvimento.”[13]

 

Para Octavio Paz, as sociedades latino-americanas são a imagens da estranheza, pois são sociedades que não conseguiram romper com o seu passado colonial e paradoxalmente, se modernizaram rapidamente. Nas sociedades latino-americanas, segundo Paz, se justapõem a contra-reforma e o liberalismo, a grande propriedade rural e a indústria, o analfabeto e o literato cosmopolita, o cacique político e o banqueiro. O problema do Estado é uma das maiores peculiaridades da história do México e da América Latina e constituí uma realidade ambígua e contraditória. Octavio Paz caracteriza o Estado criado pela Revolução Mexicana, como um desdobramento da herança espanhola e pré-hispânica. Segundo ele, salvo exceções, como as guerras civis e os períodos de anarquia, os mexicanos viveram sob o domínio de governos despóticos ou paternalistas que seriam a reencarnação dos reis-sacerdotes astecas, dos vices reis espanhóis, dos ditadores e dos “senhores presidentes” eleitos pelo PRI. Todas as tentativas de instituir regimes liberais com uma sociedade forte, organizada, e um Estado reduzido foram, afirma Paz, rechaçadas pelas garras do exército e da burocracia. Outra característica do Estado mexicano é a criação de uma vida privada incrustada na vida pública, como se o Estado fosse uma família:

 

“Em muitos de seus aspectos, especialmente no trato com a coisa pública e em sua maneira de conduzir os assuntos, [o Estado] segue sendo patrimonialista. Num regime desse tipo o chefe de governo – o príncipe ou o Presidente– considera o Estado como seu patrimônio pessoal. Por tal razão, o corpo de funcionários e empregados governamentais, (…) longe de constituírem una burocracia impessoal, formam una grande família política ligada por vínculos de parentesco, amizade, compadrio, camaradagem e outros fatores de ordem pessoal.”[14]

 

 

Ainda que todos os cortesãos comunguem no mesmo altar, afirma Octavio Paz, no regime patrimonialista não há ortodoxia ideológica, pois os vínculos são de ordem pessoal e não ideológica, impedindo que se formem corpos burocráticos semelhantes aos da Igreja Católica e do Partido Comunista. Se nas burocracias políticas e eclesiásticas a ordem hierárquica é sagrada e está regida por regras imutáveis, tais como a iniciação, a aprendizagem, a antiguidade do serviço, a competência, a diligência, a obediência aos superiores,

 

“No regime patrimonial o que conta em última instância é a vontade do Príncipe e de seus agregados.”[15]

 

 

 

Octavio Paz chama atenção para enorme contradição existente no interior do Estado Mexicano, ainda não resolvida. Trata-se de um problema que envolve a permanência cultural do patrimonialismo, encarnada na sociedade cortesã renovada. Segundo o poeta mexicano, a contradição consiste em que, todas as vezes que o corpo de burocratas tenta modernizar o país, já que esse grupo é portador de “valores modernos”,  levanta-se contra eles uma massa de amigos, parentes e “favoritos” unidos por laços de ordem pessoal e que se renova a cada seis anos, após as eleições presidenciais:

 

“Tanto por sua situação, como por sua ideologia implícita e seu modo de recrutamento, estes corpos cortesãos não são modernos: são uma sobrevivência do  patrimonialismo. A contradição entre a sociedade cortesã e a burocracia tecnocrata não imobiliza o Estado, mas torna difícil e sinuosa sua marcha.”[16]

 

 

Segundo Paz, a natureza peculiar do Estado Mexicano, se expressa pela presença em seu interior de três ordens distintas, mas em contínua comunicação e osmose: 1-a burocracia governamental, que é mais ou menos estável, semelhantes às burocracias das sociedades democráticas do Ocidente; 2- o conglomerado heterogêneo de amigos e favoritos, que é uma herança da sociedade cortesã dos Séculos XVII e XVIII; 3-a burocracia do PRI, formada pelos profissionais da política, que é mais uma associação de interesses que uma associação ideológica e um grande canal de mobilidade social. Sob a perspectiva do poeta mexicano, o partido único no México é assim definido:

 

“a burocracia do PRI está a meio caminho entre o partido político tradicional e as burocracias que militam sob uma ortodoxia e que operam como milícias de Deus ou da Historia. O PRI não é terrorista, não quer mudar os homens, nem salvar o mundo: quer salvar-se a si mesmo. Por isso quer reformar-se. Mas sabe que sua reforma é inseparável da reforma do país.”[17]

 

 

Em relação a esse ponto, o ensaio foi escrito em 1978, mas Octavio Paz toca num problema ainda atual, tanto para o México, como para a América Latina: o tema da reforma política. O problema é inseparável da história da Revolução Mexicana e da formação do PRI. O partido nasceu da necessidade de assegurar a continuidade do regime pós-revolução, diante das lutas entre as facções militares sobreviventes da guerra civil, iniciada em 1911. Até o massacre dos estudantes em 1968, a legitimidade do regime nascido com a Revolução Mexicana não havia sido questionada. A crise gerada pela violência do Estado no ano de 1968 obrigou o partido a reconhecer o pluralismo da sociedade mexicana e buscar uma nova legitimidade, sendo forçado, inclusive, a aceitar a existência de outros partidos, de outros projetos políticos e conviver com eles. Esse processo culminou com a vitória de Vicente Fox, pelo PAN, em 5 de Julho de 2000, mas isso não significa que a hegemonia do PRI terminou.

 

 

O poeta e ensaísta mexicano foi um dos primeiros intelectuais mexicanos que defendeu uma ampla reforma política na sociedade mexicana da segunda metade do Século XX, visando realizar um sonho adiado desde a Independência do México: transformar o país numa verdadeira democracia moderna. [18] Como uma estrutura circular, uma prisão do tempo que se repete e cuja metáfora é o círculo, ou como um tempo que não passa, as tentativas de reforma política, desde as reforma liberais de Benito Juárez, em 1857, até as tentativas mais recentes, fracassaram e bateram de frente contra um muro, afirma Paz. Não se trata de um muro de pedra, diz o poeta mexicano, nem de idéias, mas um muro vazio. Como se a história política mexicana desse voltas e voltas e ficasse encerrada numa estrutura cíclica e petrificada.

 

 

Em termos de construção de uma alternativa política original para o México e para a América Latina, Octavio Paz ressalta algumas permanências ligadas às tradições populares indígenas e que se fossem recuperadas, poderiam contribuir com a efetivação de uma ampla reforma democrática. A representação do tempo cíclico, na obra do poeta mexicano, aparece em alguns momentos como uma prisão, mas em outros momentos, o tempo das culturas pré-hispânicas representa na sua obra a possibilidade de uma liberação. Para Paz, voltar à origem significa realizar uma reforma política com base nas práticas democráticas tradicionais das camadas populares mexicanas. Trata-se de práticas encobertas mais ainda vivas na memória coletiva:

 

«Penso, por exemplo, nas democracias espontâneas dos pequenos povoados e comunidades, no autogoverno dos grupos indígenas, no município novohispano e em outras formas políticas tradicionais. Aí está, creio a raiz de uma possível democracia mexicana. Só que para que a Reforma Política chegue ao povo real, o Estado teria que começar por sua auto-reforma. Se democracia é pluralismo, a primeira coisa a fazer é descentralizar.»[19]

 

 

 

A persistência do patrimonialismo na cultura política do país e do continente dá um caráter muito específico à modernidade no México e ajuda a entender as deficiências da estrutura partidária e a corrupção política. A venda dos cargos, que foi autorizada pelos teólogos espanhóis durante a colonização, é uma maneira de pensar que persiste:

 

«A corrupção da administração pública mexicana, escândalo entre nós e fora, não é senão outra manifestação da persistência de dessas maneiras de pensar e de sentir que exemplifica o ditame dos teólogos espanhóis. Pessoa de inquestionável conduta privada, espelhos de moralidade em sua casa e em seu bairro, não tem escrúpulos em dispor dos bens públicos como se fossem seus próprios. Trata-se não tanto de uma imoralidade e sim da  vigência inconsciente de outra moral: no regime patrimonial são bastante vagas e flutuantes as fronteiras entre a esfera pública e a privada, a família  e o Estado. Se cada um é o rei de sua casa, o reino é como una casa e a nação como uma família. Se o Estado é patrimônio do Rei ¿como não vai sê-lo também de seus parentes, seus amigos, seus servidores e seus favoritos? Na Espanha o Primeiro Ministro se chamava, significativamente, Privado.»[20]

 

 

 

A moral patrimonialista cortesã, presente no interior do Estado Mexicano, como Octavio Paz a define, é um exemplo da

 

“incompleta modernidade” do México e por extensão de outros países da América Latina. Trata-se de uma sociedade que, dos estratos mais baixos, como o dos camponeses, até a alta burocracia e as classes médias, tropeça em traços arcaicos e modernos, já que o tempo irreversível da modernidade convive com o passado colonial e pré-colonial: “A modernização do México, iniciada a no final do século XVIII pelos vice-reis de Carlos III, segue sendo um projeto realizado pela metade (…). A Maioria de nossas atitudes profundas diante do amor, da morte, a amizade, a cozinha, a festa, não são modernas. Tampouco o são nossa moralidade pública, nossa vida familiar, o culto Virgem de Guadalupe, nossa imagem do Presidente…”[21]

 

 

Octavio Paz acredita que os mexicanos adotaram vários projetos de modernização, estreitamente ligados ao tempo irreversível e vazio da modernidade. Na sua perspectiva, o discurso da modernização no continente latino-americano é equivocado, são “máscaras”, modelos “impostos de fora” – máscaras de Robespierre e Bonaparte, Jefferson e Lincoln, Comte e Marx, Lenin… Contra essa realidade “mascarada”, ele afirma não defender um retorno a um passado imaginário, mas acreditar que o México, como outros países da América Latina, deve encontrar seu próprio caminho para a modernidade,

 

Creio que, como outros países de América Latina, México deve encontrar sua própria modernidade. Em certo sentido deve inventá-la. Mas inventá-la a partir das formas de viver e morrer, produzir e gastar, trabalhar e gozar que criaram nosso povo. É uma tarefa que exige, além de circunstancias históricas e sociais favoráveis, um extraordinário realismo e uma imaginação não menos extraordinária.[22]

 

 

A existência de múltiplas temporalidades no processo de constituição da América Latina como um todo, confere uma diversidade e uma complexidade enorme à história cultural e política desses países. Tanto que, segundo Paz, nem os termos usados para designar a região são adequados:

 

“América Latina, Hispano-América, Ibero-américa, Indo – América? Cada um desses nomes deixa sem nomear uma parte da realidade. Tampouco são fiéis as etiquetas econômicas, sociais e políticas…”.[23]

 

Os latino-americanos falam espanhol ou português, na maioria dos casos, são ou foram cristãos e seus costumes descendem diretamente da Espanha e de Portugal. Contudo, afirma Paz, apesar desses fatores unificadores, saltam aos olhos as diferenças. A primeira delas é presença dos não europeus, composta pelos índios e pelos negros, com exceção do Uruguai, Argentina e uma parte do Chile e da Costa Rica:

 

«Os índios são, alguns deles, descendentes das altas civilizações pré-colombianas do México, América Central e Peru; outros, menos numerosos, são herdeiros das populações nômades. Uns e outros, em especial os primeiros, refinaram a sensibilidade e exercitaram a fantasia de nossos povos, mesmo assim, muitos traços de sua cultura misturados aos traços hispânicos, aparecem em nossas crenças, instituições e costumes: a família, a moral social, a religião as lendas e contos populares, os mitos, as artes, a cozinha. A influência das populações negras também foi poderosa. No geral, me parece que a herança indígena se desprendeu em uma direção oposta às paixões e cultiva a reserva e a interioridade, enquanto que a herança africana exalta os valores orgásticos e corporais. «[24]

 

 

 

Outro elemento importante é o caráter peculiar da história portuguesa e espanhola no contexto europeu. Espanhóis e portugueses, diferente dos seus rivais holandeses, ingleses e franceses, foram dominados durante séculos pelo Islã, “Mas falar de dominação é enganador; o esplendor da civilização hispano-árabe, no entanto, surpreende-nos e esses séculos de lutas foram, também, de coexistência íntima. Até o século XVI, conviveram na Península Ibérica muçulmanos, judeus e cristãos. É impossível compreender a história da Espanha e de Portugal, assim como o caráter na verdade único de sua cultura, esquecendo-se essas circunstâncias. A fusão entre o religioso e o político, por exemplo, ou a noção de cruzada, apresenta-se com uma coloração mais forte na Península Ibérica que em outras partes da Europa, afirma Paz:

 

“Não é exagerado ver nesses traços as marcas do Islã e de sua visão de mundo e da história.”[25]

 

 

Outro traço específico da formação das sociedades ibéricas, que interferiu na formação da América Latina, foi a Contra-Reforma. A monarquia espanhola, afirma Paz, identificou-se com uma fé universal e com uma interpretação unilateral dessa fé:

 

«A idéia da missão universal do povo espanhol, defensor de una doutrina reputada justa e verdadeira, era una sobrevivência medieval e árabe; enxertada no corpo da monarquia hispânica.» [26]

 

Segundo Octavio Paz, a permanência da referida concepção teológico-política se manifesta hoje sob a máscara de “verdades científicas”, proferidas não mais pela Igreja e seus concílios, mas pelas vozes autorizadas dos partidos políticos no poder.  Os norte-americanos, afirma Paz, nasceram com a ilustração e a reforma, ou seja, nasceram “com a modernidade.” A América Latina, porém, foi colonizada no auge da contra reforma e da  neo-escolástica. Segundo Paz,

 

“O fundamento filosófico da  monarquia católica e absoluta foi o  pensamento de Suárez e seus discípulos da Companhia de Jesus. Estes teólogos renovaram, com gênio, o tomismo e o converteram em uma fortaleza filosófica.”[27]

 

Segundo o historiador Richard Morse, citado por Paz, o neo-tomismo cumpriu uma dupla função: foi a base ideológica de sustentação do Império espanhol e, também, escola dos intelectuais latino-americanos, que modelou seus hábitos e suas atitudes, não como filosofia, mas como “atitude mental.” Trata-se de uma influência que, para o poeta mexicano, ainda sobrevive entre os intelectuais latino-americanos. Ainda que a hegemonia da neo-escolástica como filosofia tenha terminado, em termos de atitude mental ela ainda persiste até hoje na América Latina,

 

 

Nossos intelectuais abraçaram sucessivamente o liberalismo, o positivismo e agora marxismo-leninismo; porém, em quase todos eles, sem distinção filosofias, não é difícil perceber de modo oculto, porém vivas, as atitudes psicológicas e morais dos antigos campeões da neoescolástica. Paradoxal modernidade: as idéias de hoje, são as atitudes de ontem. Enquanto os seus avôs juravam em nome de São Tomás, eles em nome de Marx, mas para uns e outros a razão é uma arma à serviço da verdade com maiúscula. A missão do intelectual é defendê-la (…). Assim se perpetuou em nossas terras uma tradição intelectual pouco respeitosa com relação á opinião alheia, que prefere as idéias á realidade e os sistemas intelectuais a crítica dos sistemas.[28]

 

 

 

Para Octavio Paz o erro da América Latina foi buscar modelos exteriores ao seu contexto sócio-histórico. Ele cita o exemplo do Japão, como um país que se modernizou sem perder de vista suas tradições. Sob esse aspecto, segundo Xavier Ledesma, ao elogiar o crescimento econômico japonês, Paz deixa de lado o nível de exploração econômica e de alienação da sociedade japonesa e

 

“não se refere especificamente aos anseios imperialistas deste país que o converteram historicamente em uma ameaça para as nações da bacia do Pacífico oriental.”

 

[29] Fica clara aqui, então, a maneira como o conceito de desenvolvimento econômico é acrítico, na obra de Paz.

 

 

No final dos anos 1990, Octavio Paz era considerado um dos mais importantes representantes do pensamento liberal no México[30], mas por outro lado, foi um dos primeiros intelectuais que exigiram a abertura da estrutura política do Partido Revolucionário Institucional (PRI), que permaneceu mais de 70 anos no poder. Paz, ao longo de sua trajetória, estabeleceu uma relação bastante contraditória com os governos do PRI. Tanto que, após o massacre dos estudantes pelo governo do PRI no dia 2 de Outubro1968[31], Paz demitiu-se do cargo de embaixador na Índia, em repúdio contra a morte dos estudantes e transformou-se passageiramente em “modelo da esquerda latino-americana”[32]. Nesse período, Paz fundou e dirigiu  as revistas Plural e Vuelta, revistas que congregavam intelectuais que faziam oposição ao PRI.

 

Para concluir vale dizer que se, por um lado Octavio Paz em seus ensaios expressão uma visão otimista para com a noção de desenvolvimento econômico, fruto da sua visão liberal sobre a história da América Latina. Por outro lado, todavia a leitura de seus ensaios pode funcionar como um antídoto contra o discurso nacionalista, que tende muitas vezes a simplificar a complexidade da história latino-americana. Sob esse aspecto, acreditamos que a obra crítica de Paz se aproxima da perspectiva de Nestor García Canclini, para quem a reflexão sobre a modernidade latino-americana, deve considerar “a heterogeneidade sociocultural, a dificuldade de realizar-se em meio aos conflitos entre diferentes temporalidades históricas que convivem em um mesmo presente.”[33] Para Canclini, assim como para Octavio Paz, refletir sobre a América Latina significa, então, enfrentar o desafio de considerar a multiplicidade das temporalidades constitutivas da história latino-americana, sem recair nas simplificações do discurso nacionalista.

 

 

Obras de Octavio Paz citadas:

 

PAZ, Octavio. Tiempo Nublado. IN: México en la Obra de Octavio Paz, V. I. El Peregrino en Su Patria. México, D. F., ed. Fondo de Cultura Económica, 1987.

 

PAZ, Octavio. Sor Juana Inês de la Cruz, o las Trampas da Fé. MÉXICO, D. F.. Ed. Fondo de Cultura Econômica, 1995.

 

PAZ, Octavio. El Ogro Filantrópico. IN: México en La Obra de Octavio Paz. El Peregrino em Su Pátria. México, D. F. Ed. Fondo de Cultura Econômica, 1987.

 

PAZ, O, América Latina y la Democracia. (Tiempo Nublado). In: México en La Obra de Octavio Paz. El Peregrino em Su Pátria. México, D. F. Ed. Fondo de Cultura Econômica, 1987.

 

BIBLIOGRAFIA

 

CANCLINI, Nestor. Culturas Hibridas, poderes oblíquos. São Paulo, EDUSP, 1998.

 

ELLIOT, J H. A Conquista e a Colonização da Da América Espanhola. IN: HISTÓRIA DA AMÉRICA LATINA COLONIAL, V. I, EDUSP, FUNAG, (org. Leslie Bethell), 2001.

 

MORLEY, Sylvanus. La Civilización Maya. México, D. F., Editora Fondo de Cultura Económica, 1ª ed. 1946.

 

LEDESMA, Xavier, El pensamiento político de Octavio Paz, Las Trampas de La Ideologia. México, D.F., Plaza Y Valdes, S/D, p. 470.

 

REIS, José Carlos. Tempo, História, Evasão. Campinas, SP : Papirus, 1994.

 

WERZ. Nicolaus. Pensamiento sociopolítico moderno en América Latina. Caracas, Venezuela, Editorial Nueva Sociedad, 1995.

 

 

NOTAS

 

 

* Doutor em Teoria e História Literária pela UNICAMP. Mestre em História Social pela USP. Professor da Faculdade de Comunicação Social do Centro Universitário UNIFIEO/BRASIL/São Paulo. Pos-doutorado em andamento sob a supervisão da professora Dra Vera Lucia Vieira, no Centro de Estudos sobre a América Latina e o Caribe (CEHAL) na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. O artigo é parte da tese de doutorado intitulada: O Círculo, a linha e a espiral: temporalidades da poesia e da história na obra crítica de Octavio Paz.

 

** Patrimonialist State and privatization of state-owned properties in Mexico, from Octavio Paz’s standpoint


Abstrac:

 

The article addresses Octavio Paz’s essays about Mexico’s history.  In these essays, the interpretations of the Mexican poet about the colonial Spanish heritage, understood as a striking feature of the Mexican past and, by extension, of the Latin American history, are recovered. The article aims to show how, from Paz’s standpoint, Mexico and other countries in Latin America have the marks of the patrimonialist State rooted in their political culture, which originates the confusion between public and private sphere, in the level of the relations established between State and society.

Keywords: Mexico. Latin America; Political culture; Patrimonialist; State. Public sphere.

 

 

[1] Segundo Sivanus G. Morley, a base do sistema do calendário Maya era o ciclo de 260 dias e o de 365. Eram dois calendários engrenados que se repetiam ciclicamente e regressavam ao ponto de partida a cada 52 anos. Porém, afirma o Morley, “las inscripciones de las estelas compreendían períodos de tiempo más largos que, con una sola excepción se basaban en el sistema vigesimal de múltiplos de veinte. Usando estos períodos más largos, los mayas contaban el tiempo trascurrido desde la fecha hipotética del comienzo de su cronología.” (p. 447). A preocupação dos Maias com o transcorrer do tempo é algo difícil de explicar, afirma Morley, seu calendário anual com as indispensáveis cerimônias e rituais se repetiam incessantemente, “pero no sabemos todavía qué pueden haber significado para los mayas los períodos de tiempo mayores, ni por qué puede haber sido tan importante para ellos marcar periódicamente el número exacto de años, meses y días que habían trascurrido desde el punto inicial de su cronología. Sin embargo, para ellos debe haber sido de vital importancia, puesto que resultó en un sistema intelectual de tal complejidad.” (453). Para o autor, o refinamento estético dos maias, sua arquitetura, seu sistema astronômico, a complexidade de seu calendário e a precisão de seus sistemas matemáticos e de escrita, não foram superados por nenhuma outra cultura do novo mundo e poucas culturas do velho mundo conseguem se igualar aos maias, “Los mayas pueden muy bien emergir hacia una comparación desapasionada, entre las grandes culturas del mundo.”(459). Morley, Sylvanus. La Civilización Maya. México, D. F., Editora Fondo de Cultura Económica, 1ª ed. 1946.

 

 

[2] PAZ, Octavio. Tiempo Nublado. IN: México en la Obra de Octavio Paz, V. I. El Peregrino en Su Patria. México, D. F., ed. Fondo de Cultura Económica, 1987, PP. 8-9.

 

 

[3] REIS, José Carlos. Tempo, História, Evasão. Campinas, SP : Papirus, 1994, p. 127.

 

 

[4] Elliot, J H. A Conquista e a Colonização da Da América Espanhola. IN: HISTÓRIA DA AMÉRICA LATINA COLONIAL, V. I, EDUSP, FUNAG, (org. Leslie Betehell), 2001, p. 144.

 

 

[5] Ídem, ibidem, p. 144.

 

 

[6] No original em espanhol: «Muerte puede dar cualquiera; vida, sólo puede hacerlo Dios: luego sólo con darlaPodéis a Dios pareceros. APUD: PAZ, Octavio. Sor Juana Inês de la Cruz, o las Trampas da Fé. MÉXICO, D. F.. Ed. Fondo de Cultura Econômica, 1995, p. 36.

 

 

[7] Ver: PAZ, Octavio, PAZ, Octavio. Sor Juana Inês de la Cruz, o las Trampas da Fé. MÉXICO, D. F.. Ed. Fondo de Cultura Econômica, 1995, p. 257.

 

 

[8] Ídem, ibidem, p. 259.

 

 

[9] Ídem, ibidem, p. 38.

 

 

[10] Ídem, ibidem, p. 39.

 

 

[11] Ídem, ibidem, p. 39.

 

 

[12] Ídem, ibidem, p. 41.

 

 

[13] PAZ, Octavio. El Ogro Filantrópico. IN: México en La Obra de Octavio Paz. El Peregrino em Su Pátria. México, D. F. Ed. Fondo de Cultura Econômica, 1987, p. 318.

 

 

[14] Ídem, ibidem, p. 326.

 

 

[15] Ídem, ibidem, p. 326.

 

 

[16] Ídem, ibidem, p. 327.

 

 

[17] Ídem, ibidem, p. 329.

 

 

[18] Octavio Paz, ao ser interrogado sobre quais seriam os partidos políticos que poderiam fazer frente à Hegemonia do PRI, no final dos anos setenta, afirma que o único partido capaz de lográ-lo seria o PAN (Partido da Ação Nacional, hoje no poder). O Partido Comunista Mexicano, segundo ele, era um partido universitário, cuja defesa do pluralismo democrático não ia além da defesa do centralismo democrático e da superficial autocrítica com relação à herança stalinista. O Partido Mexicano dos Trabalhadores, nascido da crise de 1968, apesar da sua base popular, não estava, nos anos 70, em condições de formular um projeto nacional que o distingui-se dos outros partidos de esquerda. Pode-se notar duas ausências importantes na estruturas partidária do México, afirma Paz. A primeira, é a inexistência de um partido conservador como o Partido Republicano, nos EUA. A Segunda ausência, é a de um autêntico partido socialista com inserção entre os trabalhadores e intelectuais. Para Octavio Paz, não havia no México, uma tradição socialista democrática, e mesmo após a fundação do PRD, o poeta mexicano nunca se entusiasmou com as proposições do PRD, em função de suas posições políticas liberais que se opunham ao projeto democrático e popular do PRD.

 

 

[19] Ídem, ibidem, p.335.

 

 

[20] Ídem, ibidem, p. 336.

 

 

[21] Ídem, ibidem, p. 337.

 

 

[22] Ídem, ibidem, p. 337.

 

 

[23] PAZ, O. , América Latina y la Democracia. (Tiempo Nublado). In: México en La Obra de Octavio Paz. El Peregrino em Su Pátria. México, D. F. Ed. Fondo de Cultura Econômica, 1987, p. 461.

 

 

[24] Ídem, ibidem, p. 462.

 

 

[25] Ídem, ibidem, p. 463.

 

 

[26] Ídem, ibidem, p. 464.

 

 

[27] Ídem, ibidem, p. 465.

 

 

[28] Ídem, ibidem, p. 466.

 

 

[29] LEDESMA, Xavier, El pensamiento político de Octavio Paz, Las Trampas de La Ideologia. México, D.F., Plaza Y Valdes, S/D, p. 470.

 

 

[30] WERZ. Nicolaus. Pensamiento sociopolítico moderno en América Latina. Caracas, Venezuela, Editorial Nueva Sociedad, 1995: 219.

219)

 

 

[31] O governo mexicano ordenou no dia 2 de Outubro de 1968, que o exército reprimisse brutalmente os estudantes que reivindicavam reformas democráticas na universidade e na sociedade mexicana. As vítimas somam mais de trezentos mortos, cujos corpos não foram encontrados até hoje. Após o massacre dos estudantes, Octavio passou a criticar abertamente o regime de partido único vigente no México desde a criação do Partido Nacional Revolucionário (PNR), em 1929.

 

 

[32] Idem, p. 220.

 

 

[33] CANCLINI, Nestor. Culturas Hibridas, poderes oblíquos. São Paulo, EDUSP, 1998, p. 83.

 

Ariadna Tucma Revista Latinoamericana. Nº 9. Marzo 2014 – Febrero 2015. Volumen I

 

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